Varejo de moda volta aos números pré-pandemia11 min read

As companhias de capital abertas do varejo de moda já registram retomada do fluxo de consumidores em suas lojas, com elevação das receitas, dos lucros e das margens, conforme demonstrou o conjunto de balanços do 1º do trimestre do segmento. Mas, passado o pior momento da pandemia, outros desafios surgem no horizonte, como a alta da inflação e dos juros.

Na avaliação da head de varejo e co-head de Equity Research da XP, Danniela Eiger, o aumento dos preços causa um impacto generalizado, mas algumas empresas se diferenciam entre si por conta do público-alvo que atingem. Companhias mais voltadas para a alta renda, como Grupo Soma (SOMA3) e Arezzo (ARZZ3), por exemplo, podem se sobressair, disse ela, por oferecerem uma maior resiliência e contarem com um crescimento orgânico mais sólido.

Para as demais empresas, contudo, a XP vê que o cenário macroeconômico terá um peso maior, levando em conta a inflação já elevada (e com potencial de subida) e o poder de compra reduzido do brasileiro. “Neste aspecto a Renner (LREN3) é uma boa opção para se ter nesse setor, pois está posicionada acima dos seus pares e já teve correção de valuation, com destaque tanto para crescimento quanto de rentabilidade”, afirmou Danniela.

Juros

Além da inflação, Felipe Demolein, analista da Eleven, destacou que, com a alta dos juros, as empresas com múltiplos mais altos e que dependem muito de consumo acabarão tendo mais impactos. “Esses setores, como o de varejo e vestuário, são mais sensíveis à inflação e taxa de juros, e vão acabar sofrendo um pouco mais com o cenário macroeconômico”, pontuou.

Por outro lado, Flávio Conde, da Levante, disse acreditar que o pior já passou. Com a volta das pessoas aos shoppings e a chegada do frio, ele afirma que os próximos trimestres devem ser positivos para as empresas de vestuário. Especificamente no 2º trimestre, a perspectiva positiva tem como alavancas o Dia das Mães e o Dia dos Namorados.

“Eu diria que o pior já passou para essas empresas. Tem outra coisa positiva que vai continuar a fazer as pessoas comprarem que é a questão de não haver mais o medo de ir ao shopping, com o número de mortes e casos menores da pandemia”, acrescentou ele.

Volta às lojas

O arrefecimento da pandemia trouxe, sem dúvida, uma normalização das atividades comerciais pelo país, após os fechamentos de lojas que ocorreram por alguns períodos nos últimos dois anos. A expectativa agora é de que categorias como vestuários e calçados, que deixaram de ser prioridade de parte dos consumidores, voltem a ingressar nas cestas de compras, por contarem com uma demanda reprimida.

“Isso foi refletido com mais força no varejo físico por conta da reabertura das lojas, a normalização do cotidiano das pessoas e os shoppings que estão com tráfego melhor. É uma categoria que tem correlação com eventos, com sair de casa, ir a um casamento, festa ou aniversário”, apontou Danniela.

Mas, segundo ela, há uma clara disparidade entre as empresas de baixa e de alta renda. No Grupo Soma (SOMA3), por exemplo, ficou evidente a dinâmica forte de crescimento e de rentabilidade, além das sinergias de integração com a Hering. O mesmo ocorreu com a Arezzo (ARZZ3), segundo Danniela, que registrou crescimento de rentabilidade e receitas.

“De baixa renda, a C&A (CEAB3) teve uma aceleração de crescimento, mas ainda com margens pressionadas, pois não conseguiu repassar totalmente o preço aos consumidores. A C&A teve inclusive Ebitda negativo. Já a Renner (LREN3) teve aceleração mais forte do crescimento, mas também tem uma dinâmica de margem bastante comprimida. A expectativa é que a Renner tenha cada vez mais uma trajetória de recuperação de vendas e de rentabilidade”, afirmou a head de varejo da XP.

Felipe Demolein, analista da Eleven Financial, acrescentou que Arezzo e Soma tiveram um poder maior de repasse dos custos inflacionários aos clientes. “Por isso, essas empresas acabam tendo resultados mais resilientes”, com bom crescimento de margem bruta e Ebitda. Já Renner e C&A tiveram uma força menor para repassar preços, mas também apresentaram boa recuperação de margens, apesar de pressionadas por SG&A (despesas gerais e administrativas).

Assim, segundo Demolein, Arezzo e Soma, que trabalham com um nicho mais premium, têm conseguido aproveitar bem o momento e ganhar share (participação) no mercado, também no segmento multicanais, enquanto Renner e C&A ainda têm margens pressionadas.

Repasses de custos

A questão que mais preocupava o mercado antes dos resultados do 1T22 era se essas empresas iriam conseguir repassar as pressões inflacionárias aos consumidores sem comprometer as vendas.

Flávio Conde, analista da Levante Investimentos, destacou que as empresas do setor tiveram crescimento alto de vendas, com destaque para Soma e Guararapes (GUAR3), enquanto que as melhores margens brutas vieram de Renner (+3,0 p.p.) e Arezzo (+3,4 p.p.).

“Renner, Arezzo e também a C&A mostraram para o mercado – que estava preocupado com custo e vendas – que elas conseguiram fazer os dois ao mesmo tempo: aumentaram margens (mesmo repassando a inflação) e ainda conseguiram aumentar as vendas”, afirma Flávio. Já a Soma, apesar da queda de 9,3 p.p. na margem, tinha uma base de comparação alta e permanece com uma margem elevada (55,3%).

Varejo de moda tem alta de 56% das receitas

Somadas as receitas líquidas do 1T22 das seis empresas de varejo de moda houve alta de 56% das receitas no comparativo com o mesmo trimestre de 2021. As receitas das seis empresas somaram R$ 4,662 bilhões no 1T21 e, agora, fecharam março com R$ 7,284 bilhões.

Com exceção de Marisa, outras cinco empresas registraram avanço nas receitas nos três primeiros meses de 2022 (Arezzo, C&A, Renner, Soma e Guararapes).

Em percentuais, as maiores altas de receitas foram de Arezzo (+67,9%) e Renner (+63,4). A Renner também somou a maior fatia de receitas do segmento no 1T22, com R$ 2,22 bilhões.

Veja o comparativo completo (% comparativo ao 1T21)

Resultados 1T22Lucro/prejuízo líquidoReceita líquidaMargem brutaMargem Ebitda aj.
Arezzo (ARZZ3)R$ 57,5 milhões (+94%)R$ 839 milhões (+67,9%)53,4% (+3,4 p.p.)+15,9% (+2,9 p.p.)
C&A (CEAB3)– R$ 152,7 milhões (+10%)R$ 1,19 bilhão (+54,2%)45% (+4,2 p.p.)-8,9% (+8,3 p.p.)
Renner (LREN3)R$ 191,6 milhões (+229%)R$ 2,22 bilhões (+63,4%)55,1% (+3,0 p.p.)+17,2% (+14,9 p.p.)
Soma (SOMA3)R$ 42,5 milhões (+185%)R$ 1,01 bilhão (+187%)55,3% (-9,3 p.p.)+10,2% (+3,6 p.p.)
Marisa (AMAR3)– R$ 77,2 milhões (+44)R$ 434 milhões (+49,9%)47,4% (+2,0 p.p.)
Guararapes (GUAR3)– R$ 80,1 milhões (-23,6%)R$ 1.735 bilhão (+39,6%)57,9% (-5,9 p.p.)+3,6% (+0,9 p.p.)

Recuperação em abril e maio, mas cautela permanece

Confirmando a retomada, os números preliminares do segundo trimestre já mostram recuperação. Esse movimento, conforme a Levante, pode ser explicado pelos seguintes fatores: liberação do saque parcial do FGTS na metade de abril; antecipação do 13° entre abril e maio; e o aumento do fluxo de pessoas após o abrandamento da pandemia.

Outro fator é chegada das baixas temperaturas no Sul e Sudeste, que tradicionalmente impulsionam as vendas do segmento de vestuário. Com o frio, as varejistas de moda comercializam suas peças das coleções outono-inverno, que normalmente possuem um tíquete médio mais alto, além de impulsionar o volume de vendas nas lojas.

A título de exemplo, a Guararapes, controladora da Riachuelo, reportou uma boa aceitação da coleção outono-inverno, com crescimento de 45% na receita de mercadorias do 1T22, com as vendas ganhando mais força nos meses de abril e maio.

Já a C&A também sinalizou um aumento do fluxo nas lojas, além de ter conseguido negociar diretamente com tecelagens os tecidos de fornecedores asiáticos para as confecções com quem tem parceria – diante do aumento dos custos de produção – para garantir preços mais competitivos para o consumidor.

“Diante das informações trazidas pelas companhias do setor de varejo, podemos ficar um pouco menos pessimistas com relação aos próximos trimestres, embora as incertezas impostas pelo cenário atual ainda exijam certa cautela”, escreveu a Levante em relatório.

“Olhar para um período de apenas dois meses não pode ser considerado tão relevante ainda, portanto, seguimos monitorando uma melhora mais robusta nos indicadores macroeconômicos, em especial a inflação”, acrescentou a Levante Investimentos.

Mais lucrativas do trimestre

Arezzo (ARZZ3)

Arezzo&Co teve a maior alta percentual de receitas no 1T22, de 67,9% contra o 1T21. Se comparar com o período pré-pandemia (1T19), a receita mais do que dobrou, aumentando 125%. O resultado foi impulsionado pelo crescimento orgânico (+46% vs. 2019) e também inorgânico.

A marca Schutz se manteve como destaque da Arezzo, impulsionada principalmente pela Schutz EUA, embora a Arezzo também tenha reportado um sólido desempenho, mesmo sendo uma marca mais madura, avalia a XP.

A margem bruta da Arezzo cresceu +3,4 p.p a/a, devido à fácil base de comparação do canal de franquias, maiores vendas pelo preço cheio nos canais sell out e uma maior participação das Schutz EUA.

Para os próximos trimestres, a Arezzo forneceu indicações positivas, com um crescimento de sell out de +73,5% em abril vs. 2019, enquanto a recente depreciação do real deve contribuir positivamente para a margem da Schutz EUA no 2T22.

Grupo Soma (SOMA3)

Já o Grupo Soma (SOMA3) reportou resultados sólidos no 1T22, com um forte crescimento de receita e indicações positivas em todas as marcas. A receita líquida consolidada aumentou 56% ano contra ano (a/a), puxada tanto por Soma excluindo Hering (+60% a/a) como com Hering (+51% a/a).

Em Grupo Soma ex-Hering, destaque para Farm (+38% a/a), Animale (+50% a/a), Farm Global (+105% a/a) e NV (+66% A/a) como as principais contribuições para crescimento no trimestre, enquanto a Hering postou vendas recordes para um 1º trimestre à medida que o foco do Soma foi reduzir a ruptura e melhorar o nível de entrega para fomentar o crescimento de vendas (sellout).

O varejo físico foi o destaque do Grupo Soma (lojas próprias +110% a/a, franquias +46%) por conta da base fácil de comparação, apesar do atacado ter se mantido forte (+62% a/a) e o digital ter crescido 15% em cima de uma base forte. A integração com a Hering segue a todo vapor, segundo o CEO, Roberto Luiz Jatahy Gonçalves, e o foco agora é abastecer de forma adequada a cadeia para não gerar rupturas.

Lojas Renner (LREN3)

A Lojas Renner somou resultados sólidos de crescimento de receita, mas rentabilidade ainda pressionada. A receita líquida consolidada cresceu +38% vs. 2019, impulsionadas pela recuperação do varejo e pelo crescimento de receitas da Realize de +72% a/a, suportadas pela expansão de seu portfólio combinada a maiores gastos no Meu Cartão.

O lucro líquido totalizou R$ 192 milhões (+21% a/a) beneficiado pelas receitas financeiras sobre os recursos levantados no follow-on, combinadas a um menor pagamento de impostos devido a incentivos fiscais.

“A empresa destacou que o crescimento de receitas acelerou em abril/22 e está acima das expectativas, deixando-os otimistas quanto à dinâmica de resultados no curto prazo. No entanto, também enxergamos o aumento dos níveis de inadimplência na Realize como um ponto de atenção, uma vez que ele está acima dos níveis de 2019”, afirma a XP.

Para Flávio Conde, da Levante, a Renner é uma empresa bem estruturada e de sucesso. Ele destaca que as ações estão muito baratas pois estão no mesmo preço de 2018. “A Renner tem a melhor combinação de resultado do 1T22. Além disso, ela fez uma captação de quase R$ 4 bilhões em abril do ano passado e ela não gastou o dinheiro. As outras empresas têm alguma dívida, e ela não tem dívidas”, afirma.

A perspectiva da Renner para o 2T22 também é boa. “Abril segue acelerando em volume de peças e transações em torno de dois dígitos. O resultado de vendas têm sido superpositivos”, afirmou Fabio Adegas Faccio, CEO da Renner, ao destacar o bom desempenho de vendas até o momento com o Dia das Mães.

FONTE

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